gr. ἔρος, érôs: desejo, amor. Força de união e de engendramento, érôs, “desejo apaixonado”, desempenha nas cosmogonias o papel de um modelo de atração, de fecundidade e de ordem., aquele de uma causa motora e ordenadora. (v. philia) (Gobry)
Peters
1. Eros é uma das muitas personificações que aparecem nas cosmogonias pré-filosóficas. Mas, ao contrário da maioria das outras que representam estados, v. g. Noite, Caos, Terra, Céu (ver observações de Aristóteles na Metafísica 1071b), Eros é uma força. Nas cosmogonias órficas ele tudo une e destas uniões nasce a raça dos deuses imortais (ver Aristófanes, Aves 700-702); em Hesíodo situa-se entre os primeiros a emergirem do Caos e arranca tudo o mais (Theog. 116-120); segundo Ferecides (conforme é referido por Proclo, In Timeu II, 54), quando Zeus deseja criar (demiourgein) transforma-se em Eros. Eros é pois uma força motriz num modelo sexual usada para explicar o «casamento» e o «nascimento» dos elementos mitológicos, uma espécie de «Primeiro Motor» nas antigas cosmogonias, e como tal foi reconhecido por Aristóteles (Metafísica 984b). E até mesmo quando os ornamentos mitológicos começaram a dissolver-se nas especulações do Eros dos physikoi, o motor, ou, mais frequentemente agora, Afrodite, continuou a desempenhar um papel na conjunção dos poderes opostos (ver enantion, dynamis). Tal é, por exemplo, o caso em Empédocles onde é o Amor (philia) e Afrodite que unem os elementos (frg. 17, versos 20-26; Diels 31A28; Aristóteles, Metafísica 985a, 1075b, vê também as forças morais em ação). Em Parmênides ela é o daimon «que tudo guia» (frg. 12, verso 3), uma imagem que persiste na literatura grega (ver Eurípides, Hipp. 447-450, 1278-1281) e é ainda visível na invocação inicial que Lucrécio faz de Vênus «que sozinha governa a natureza das coisas» (I, 21).
2. Todos estes exemplos do emprego de amor têm que ver com o elevar uma emoção humana ao nível de uma força cosmológica, operação que é particularmente clara para Empédocles (fr. 17, versos 22-24). E num dos mais extensos tratamentos do eros feito por um filósofo, o Simpósio de Platão, ainda está em evidência a mesma concepção. O discurso de Erixímaco (185e-188e) mostra a extensão deste princípio de «atração» na natureza, e esta noção e outras similares, familiares quer aos mitólogos quer aos physikoi, preenchem a maior parte dos outros discursos. O discurso de Sócrates, porém, orienta-se num novo sentido onde o amor humano é usado como um importante conceito moral e epistemológico.
3. Sócrates como «o amante» (erotikos) foi um lugar comum em Atenas. Aparece como tal em Xenofonte (Mem. II, 6, 28; Symp. IV, 27) e a noção é frequentemente combinada com a ironia familiar: eu não sei nada a não ser a respeito de eros (ver Theag. 128b, Lys. 204b, e comparar o comentário de Alcibíades em Symp. 216d). Que houve traços fisicamente eróticos nas relações de Sócrates com os jovens de Atenas dificilmente se pode pôr em dúvida; mas o seu eros tinha também um outro aspecto, como Alcibíades, que tentara seduzi-lo (Symp. 217a-219d), descobriu; Sócrates podia distinguir entre paixão e o seu objeto.
4. O problema filosófico do amor, chamado aqui philia, amizade, é levantado pela primeira vez no Lysis onde Sócrates, em busca de uma definição desta atração entre os homens, sugere que talvez ela seja análoga à atração do semelhante pelo semelhante (homoios) que já fora enunciada pelos poetas e pelos physikoi (Lys. 214a-c; para a importância primordial deste princípio nas teorias de percepção, ver aisthesis, passim). Isto é rejeitado, tal como o seu contrário, de que o dissemelharite é atraído pelo dissemelhante (216b). Fixa-se, finalmente e sem grande convicção, num princípio que remontava à teoria médica e tinha aplicações importantes nas teorias contemporâneas do prazer (ver hedone): o desejo (epithymia) e o seu consequente, o amor, é dirigido para o preenchimento de uma falta (endeia) e o seu objeto, por conseguinte, é algo que é apropriado (oikeion; confrontar o desenvolvimento posterior disto no estoicismo em oikeiosis), i. e., algo que não é nem idêntico nem completamente dissemelhante e contudo deficiente na nossa constituição.
5. O tema é retomado no Simpósio: o amor é um desejo dirigido para o belo (kallos) e necessariamente envolve a noção de uma necessidade ou falta (endeia, 200e-201b). Sócrates começa então a citar a doutrina aprendida com uma sábia profetiza, Diotima. Eros, agora reinvestido com os ornamentos do mito, é um grande daimon um dos intermediários (metaxu) entre o divino e o mortal (202e). Depois, subitamente, a ironia socrática é explicada: Eros é também o meio caminho entre a sabedoria (sophia) e a ignorância pelo fato de o homem que não tem o sentido da sua própria deficiência não ter amor da sabedoria (philosophia, 204a). O amor é definido como o desejo de que o bem seja nosso para sempre (206a), a procura de uma natureza mortal ser imortal (207d) que ele realiza gerando (gênesis; confrontar o uso em certa medida semelhante que Aristóteles faz de gênesis em kinoun 9).
6. No Symp. 209e Diotima detém-se (uma quebra vista por alguns como a linha divisória entre o eros socrático e o platônico) e então mergulha num estudo final do verdadeiro eros. O concurso dos belos corpos gera belos discursos (logoi). O amante afasta-se de um único corpo e torna-se um amante de todos os corpos belos (em Charm. 154b Sócrates confessara que todos os jovens lhe pareciam belos), daí para as belas almas, leis, observâncias, e conhecimento (episteme), libertando-se sempre da ligação ao particular, até que «subitamente» lhe é revelada a visão da própria beleza (211b; a rapidez da visão é de novo acentuada in Ep. VII, 341). Esta é a imortalidade.
7. O que foi revelado são, evidentemente, os eide transcendentes. Sócrates tem muito mais a dizer a respeito do lado puramente psicológico do amor no seu primeiro discurso no Fedro (237b-241d; definido, 238b-c, como um desejo irracional dirigido, para o gozo da beleza).
Mais tarde, porém, desdiz-se e promete uma palinódia (243b-c), e é aqui que o eros e a philosophia se juntam de novo. A irracionalidade do amor é na verdade um tipo de loucura divina (theia mania, 245b-c; do mesmo modo a mantike, que explica a presença de Diotima no Symposium), e está presente na alma como reflexo da lembrança (anamnesis) que a alma tem dos eide que lhe foram revelados antes da sua «perda de asas» (248c; ver kathodos). É a alma do filósofo que primeiro recupera estas asas pelo exercício da recordação que ela tem dos eide e pela orientação da sua vida em concordância (249c-d); O filósofo é a isto estimulado pela visão da beleza terrena. É a beleza que particularmente move a nossa recordação porque ela opera através do mais agudo dos nossos sentidos, a visão (249d-250d).
8. O eros platônico é uma atividade dupla: é uma comunicação com e um movimento no sentido do mundo transcendente dos eide, e ao mesmo tempo é o afluir à alma do amado, cuja beleza (masculina) é uma imagem de Deus, aquelas «correntes de Zeus» que entram na sua alma (252c-253a). O amado não desaparece numa neblina de sublimação mas permanece um companheiro necessário na busca dos eide (confrontar Ep. VII, 341c-d). O que é sublimado nestas relações, que são arquetipicamente representadas por Sócrates e pelos seus jovens discípulos, é a atividade puramente sexual. Platão tem consciência de que a restrição aqui é difícil e nem sempre bem sucedida mas ele não se sente inclinado a julgar com demasiada severidade (255b-256e).
9. Depois de Platão eros e as suas noções correlatas desaparecem das posições exaltadas que lhes são dadas nestes diálogos e tomam um lugar mais modesto na ética sob a rubrica da amizade (Aristóteles dedica o livro viu da Ethica Nichomacos a philia; os seus aspectos mais latos, humanitas e philantropia estavam muito em voga no estoicismo: Cícero, De Off. I, 50-51 e ver oikeiosis) ou sob a do amor apaixonado. Epicuro e, na verdade, a maioria dos filósofos opunham-se à segunda baseando-se no fato de ela destruir a ataraxia do pensador sério (ver D. L. X, 118), mas a diatribe violenta dirigida contra cupido por Lucrécio (IV, 1058-1287) sugere mais uma aporia pessoal do que filosófica.
10. Como era de esperar o eros platônico reaparece em Plotino, precedido, nas Enéadas I, 6, por uma estética das coisas sensíveis. Platão tentara algo semelhante no Hípias Maior onde a beleza é definida primeiro em termos do útil e, depois, do agradável (295c, 298a; confrontar o argumento paralelo em Górg. 474d). Plotino segue outro caminho; a beleza (kallos) não é, como foi para os estoicos (ver Cícero; Tusc. IV, 33), uma questão de medida (metron) ou a simetria das partes visto que isto seria sugerir que a beleza está confinada aos compósitos e não pode explicar a beleza de uma simples estrela à noite no céu. A própria explicação de Plotino (I, 6, 2-3) é uma curiosa mistura da Forma transcendente platônica que é partilhada (koinonia, methexis) pelo objeto e o eidos aristotélico imanente ou o logos estoico. Mas a verdadeira essência da beleza é a simplicidade, simplicidade que se encontra preeminentemente no Uno (VI, 7, 32). Destas belezas sensíveis passa-se, à maneira tipicamente platônica, para as práticas e ciências e daí por uma purificação (katharsis) da alma para a contemplação da beleza superior que é o Bem (I, 6, 6). Para realizar isto a alma tem de abandonar as roupagens adquiridas por ela durante a sua descida (kathodos e confrontar ochema). Vemos o Belo com uma visão interior por nos assimilarmos a ele (I, 6, 9).
11. Tudo isto é acentuadamente platônico na imagem e na linguagem. Mas houve uma substituição igualmente notável na ênfase. A filosofia como um projeto comum entre os amantes já não está em evidência em Plotino para quem o regresso ao Uno é uma «fuga do solitário para o Solitário» (VI, 9, 11). O método de Plotino já não é o diálogo, com as suas implicações diastólicas, mas a introspecção e o seu objetivo é uma unio mystica (ver hen 13). Em Platão a veneração de Afrodite Pandemo é um estágio, e talvez um estágio que nunca é transcendido, para a adoração de Afrodite Urânia. Em Plotino, que tinha «vergonha de estar num corpo» (Porfírio, Vita Plot. I), as duas deusas estão em disputa. O Amor Terreno é por ele comparado ao rapto de uma virgem a caminho do seu Pai (VI, 9, 9). (F.E. Peters – Termos filosóficos gregos)
Notions philosophiques
O amor (eros) nasceu da piedade determinada pelos mistérios: ele é a ascensão da alma a sua pátria divina. Platão propõe assim uma filosofia que é ao mesmo tempo uma soteriologia. “O eros é a conversão do homem do sensível ao suprasensível. é a aspiração da alma pleo que está no Alto. é uma força real que projeta a alma para o mundo das Ideias”. O eros é um desejo que tende para as esferas superiores. Este amor, enquanto ato e movimento, se inscreve exclusivamente no ativo do homem. (Notions philosophiques)
Gandillac
Segundo Maurice de Gandillac, Amor (eros), amoroso (erotikos), no vocabulário de Plotino, referem-se ao segundo estágio da elevação filosófica. E apresenta a seguinte análise do que diz Plotino em Eneada-III, 5, 7.
Amor filho de Pobreza e de Expediente
O Sócrates do Banquete (203b-c) reporta o relato que lhe fez, diz ele, a sacerdotisa Diotima, dos dias em que, os deuses do Olimpo celebrando o nascimento de Afrodite, a dama Pobreza (Penia) compartilhou alguns restos de néctar com o vagabundo Expediente (Poros1). De seu furtivo casamento nasceu este Eros que Plotino descreve como um insaciável, semideus, «razão advinda nisto que não é razão» (Tratado-50) aspiração sem repouso por saciedades impossíveis, gosto de uma vagabundagem que no entanto pode conduzir um amoroso pelos caminhos do que Platão (Filebo 30c-d) denominava a «Alma real de Zeus», muito próximo da Inteligência pura.
Nesse nível, pelo meno filho adotivo da Afrodite «celeste», nascida ela mesma de Uranos ou de Cronos, figura desta Alma, que por intermédio da Inteligência procede do Princípio único de toda fecundidade, não é certamente mais o filho de Pobreza, «sem leito, sem sapatos e sem casa», mas todavia o belo amante desta Psique, que por uma espécie de sublime incesto, se une a seu genitor para se tornar ela mesma a Afrodite celeste. Relendo o grande Tratado-8, não esqueçamos no entanto que esta ascensão erótica permanece frágil, constantemente ameaçada de recaídas (Eneada-VI, 9, 9).
Descrevendo em modo mítico a “queda” das almas nos corpos, o Fedro (248c) situava no mais baixo nível aquelas que cabem aqui em baixo aos tiranos e aos sofistas, em um nível muito pouco superior aquelas dos magos e dos poetas (entendidos como profissionais da “imitação”), dos artesãos e dos cultivadores, dos adivinhos, dos atletas e dos médicos — sensivelmente mais alta aquelas dos servidores honestos da coisa pública, guerreiros corajosos e soberanos que respeitam as leis — em primeiro nível enfim aquelas que, beneficiando Acima, antes de sua queda, de uma mais rica visão do Bem, animam naturalmente aqui em baixo os amigos da sabedoria e da beleza, os amamentados das Musas e os verdadeiros amantes (erotikoi). (Maurice de Gandillac)
Agamben
Em Pselo, Padre da Igreja e filósofo neoplatônico tardio, a polaridade negativa da demonologia, já presente com impressionante riqueza de detalhes no De abstinentia de Porfírio, que apresenta, entre outras coisas, sob a influência dos demônios maléficos, a confecção de filtros amorosos, já aparece fundida com a doutrina do espírito fantástico como veículo da fascinação e do enamoramento, ao mesmo tempo em que se ressalta o caráter obscuro e sinistro do demônio aéreo, que se torna agora o agente específico da patologia erótica, dos seus desvarios e dos seus fantasmas. Segundo tal teoria, o demônio aéreo – definido brevemente como “aéreo” — age sobre o espírito fantástico dos homens e assim como o ar na presença da luz, assumindo forma e cor, transmite-os àqueles corpos que são por natureza aptos para os receber (como acontece com os espelhos), assim também os corpos dos demônios, assumindo, da essência fantástica interior, as figuras, as cores e as formas que querem, os transmitem ao nosso espírito, sugerindo-nos ações e pensamentos, e suscitando em nós formas e memórias. Desta forma, eles evocam simulacros de volúpia e de paixão em quem dorme e nos que estão despertos, e frequentemente nos excitam a virilha e instilam em nós amores insanos e iníquos.
A identificação entre (demônio) aéreo e Eros é tão completa a ponto de Pselo afirmar que os demônios aéreos lançam “flechas de fogo” que lembram de perto os ígneos raios espirituais do deus do amor.2 (AgambenE:198)
MacKenna
Plato does not treat of it as simply a state observed in Souls; he also makes it a Spirit-being so that we read of the birth of Eros, under definite circumstances and by a certain parentage. Enneads: III V. 1
The existence of such a being is no demand of the ordinary man, merely; it is supported by Theologians and, over and over again, by Plato to whom Eros is child of Aphrodite, minister of beautiful children, inciter of human souls towards the supernal beauty or quickener of an already existing impulse thither. All this requires philosophical examination. A cardinal passage is that in the Symposium where we are told Eros was not a child of Aphrodite but born on the day of Aphrodite’s birth, Penia, Poverty, being the mother, and Poros, Possession, the father.
The matter seems to demand some discussion of Aphrodite, since in any case Eros is described as being either her son or in some association with her. Who then is Aphrodite, and in what sense is Love either her child or born with her or in some way both her child and her birth-fellow? To us Aphrodite is twofold; there is the heavenly Aphrodite, daughter of Ouranos or Heaven: and there is the other the daughter of Zeus and Dione, this is the Aphrodite who presides over earthly unions; the higher was not born of a mother and has no part in marriages for in Heaven there is no marrying. Enneads: III V. 2
Jaeger
Los historiadores de la religión han señalado que Eros tuvo un culto muy antiguo en Tespias de Beocia, al pie del monte Helicón, aunque no aparezca por ninguna parte como una divinidad objeto de culto en tiempos primitivos. Dado que también Hesíodo tenía una especial relación personal con las Musas de este su propio solar, el hecho de que adjudique a Eros un papel tan importante pudiera explicarse por una natural parcialidad hacia el dios de su propia vecindad. Pero esta explicación me parece más bien superficial. Es mucha verdad que el culto pudo haberle dado una buena razón para meditar sobre esta deidad; pero esto no es bastante para dar cuenta del papel que desempeña Eros en la Teogonia. El dios objeto de culto en Tespias es simplemente un fecundador de ganados y de los matrimonios humanos; no se tornó una fuerza cósmica hasta que ocupa su puesto a la cabeza de la serie de procreaciones que dan nacimiento al ancho mundo y a los dioses mismos. Aislando así el poder productor de estas procreaciones, para colocarlo al comienzo de la serie entera como la divina causa de ésta, lleva a cabo Hesíodo una hipóstasis como las que encontramos en análogas etapas del pensamiento teológico de todos los tiempos y todos los pueblos. Esto es precisamente lo que hacen los teólogos hebreos cuando toman la frase “y dijo Dios” (la frase repetida a cada nuevo acto creador de Yahveh en el relato mosaico de la creación) y la hipostatan como Palabra creadora, como Logos, tratándola como un ser primordial de suyo y colocándola a la cabeza de la serie de actos creadores que proceden de ella. El hecho de que Eros recibiese ya los homenajes de un culto no era más importante para Hesíodo que el problema de si también eran divinidades objeto de culto el Cielo y la Tierra o Cronos y Rea. Lo importante es que la introducción de Eros es de todo punto típica del pensar teológico de Hesíodo. Enteramente aparte de los filósofos naturales a quienes ya mencionamos, encontraremos que este método de hipóstasis míticas se vuelve un procedimiento singularmente importante de explicar el mundo en la cosmología teológica de los tiempos post-hesiódicos, donde el Eros primieval de Hesíodo vuelve a tener una poderosa influencia.
Pero en otros aspectos, si comparamos esta hispóstasis griega del Eros creador del mundo con la del Logos en el relato hebreo de la creación, podemos observar una profunda diferencia en la manera de ver de los dos pueblos. El Logos es la sustancialización de una propiedad o poder intelectual del Dios creador, que está situado fuera del mundo y trae este mundo a la existencia por obra de su propio y personal fiat. Los dioses griegos están situados dentro del mundo; son descendientes del Cielo y de la Tierra, las dos mayores y más relevantes partes del universo; y se generan por obra del ingente poder de Eros, el cual pertenece igualmente al mundo como una primitiva fuerza omnigeneratriz. Están, pues, sujetos ya o lo que llamaríamos una ley natural, aun cuando el espíritu hipostático de Hesíodo se represente esta ley como un dios entre otros más bien que como un principio gobernador de todas las cosas. Pero en la concepción hesiódica encontramos ya el germen de la busca de un principio natural único con que nos tropezamos en los filósofos posteriores. La influencia de la concepción resultará especialmente clara en las nuevas formas que toma el Eros de Hesíodo en las obras de Parménides y Empédocles. Cuando el pensamiento hesiódico acaba por dejar paso a un pensar verdaderamente filosófico, se busca lo Divino dentro del mundo, no fuera de éste, como en la teología judeo-cristiana que se desarrolla a partir del libro del Génesis. Entonces se reconocerá en Hesíodo más bien un cosmogonista que un teogonista y se buscará la naturaleza divina en aquellas fuerzas por obra de las cuales se engendran todas las cosas. En esta filosofía resultará Eros más importante que todos los dioses a quienes Hesíodo le hace dar el ser. Los dioses son parte de la tradición mitológica; y como el pensar de Hesíodo está íntegramente enraizado en el mito, esto es todo lo que se necesita para hacer de ellos algo real en su teología. Como consecuencia, nunca tiene razón alguna para indagar la naturaleza de lo Divino en cuanto tal. Esta fundamental cuestión es una cuestión que no puede plantearse hasta tiempos en que se han vuelto problemáticas todas las divinas figuras individuales de Hesíodo y hasta los mitos mismos. Y semejante etapa no llega hasta el momento en que el hombre cae en la cuenta de que su única fuente de certidumbre al tratar con lo real reside en la experiencia y en un pensar fundado en ésta y consecuente consigo mismo. Si bien esta posición es sumamente distinta de la de Hesíodo, creo haber mostrado que no es absolutamente ajena a ella, sino que está en estrecha relación con su explicación teológica del mundo, que aporta en realidad el fondo a los problemas propios y peculiares de la nueva posición. Por eso es perfectamente natural que este nuevo pensar no deje de interesarse por el problema de lo Divino de una manera tan radical como se ha supuesto con frecuencia; por el contrario, acepta este problema como una de las herencias esenciales del período anterior, al mismo tiempo que lo replantea en una nueva y más general forma filosófica. (JPFG)