sympátheia: afeição a, simpatia cósmica
Termo transcrito do grego sympatheia. Para os estoicos, a simpatia universal designa ao mesmo tempo a estrutura mesma do mundo que é tal que cada coisa está ligada com todas as outras, e o fundamento da sabedoria que consiste em aceitar a ordem cósmica, quer dizer o entrecruzamento de todas as determinações. [Notions philosophiques]
1. A teoria da simpatia cósmica, associada pelos eruditos modernos ao filósofo Posidônio, assenta numa série de premissas presentes na filosofia grega quase desde o início. Os Milésios tinham considerado o mundo como sendo vivo e os pitagóricos como um todo ordenado (ver kosmos). E embora os interesses de Platão primeiro se orientassem noutras direções, ele desenvolve plenamente a ordem e o funcionamento do mundo sensível no Timeu, indiscutivelmente a sua obra mais largamente estudada na tradição posterior. Descreve aqui o kosmos como uma criatura (zoon) viva e visível, que tem dentro de si todas as coisas que são naturalmente aparentadas (kata physin syugene; Timeu, 30d).
2. O panteísmo estoico seguiu na mesma direção. Deus como logos impregna o universo como a nossa alma impregna os nossos corpos (Diógenes Laércio VII, 138; ver pneuma) e tal como a physis vitaliza o todo (Sêneca, De benef. IV, 7; ver logoi spermatikoí). Assim o kosmos é uma unidade (Diógenes Laércio VII, 140), um organismo (holon) mais do que uma totalidade (pari; SVF II, 522-524), um ser vivo racional (zoou logikon; SVF I, 111-114).
3. Aparecem aperfeiçoamentos na era de Posidônio, muitos dos quais lhe são diretamente atribuídos. Primeiro, a própria terra é um ser vivo, perpassado por uma força vital (zotike dynamis, vis vitalis; Cícero, De nat. deor. II, 33, 83) e assim, conforme Plotino sustenta um pouco mais tarde, também dotada de sensação (Enéadas IV, 4, 26). As coisas concordam por meio de uma força unificadora interior, força que parece possuir diferentes tensões (tonos) do pneuma: numa matéria inorgânica é chamada hexis; para as plantas, physis; para os animais, psyche; e para os homens, noûs (Sexto Empírico, Adv. Math. IX, 81-85; Fílon, Quod Deus 35). Que estas não são ordens de realidade radicalmente distintas é evidente por certos fenômenos naturais, como o crescimento das rochas durante o tempo em que estão em contato com a vis vitalis da terra (Plotino, Enéadas IV, 4, 27) e a presença na natureza de zoófitos (Nemésio, De nat. hotn. I, 509a-b), calculados para preencher as lacunas da scala naturae (teoria comum desde a descrição clássica de Aristóteles na Hist. anim. 588b-589a; para a sua aplicação ao mundo espiritual, ver trias 4).
4. Da observação da inter-relação (symphya; Sexto Empírico, Adv. Math. VII, 129) natural tanto das coisas orgânicas como das inorgânicas resulta a doutrina da sympatheia ou da sua interação mútua, ilustrada por uma grande variedade de fenômenos naturais e particularmente pelo complexo de efeitos exercidos pelo Sol e pela Lua sobre a vida na terra (Sexto Empírico, op. cit. X, 78-80; Cícero, De nat. deor. II, 7, 19), e mais tarde proeminente em Marco Aurélio, Fílon e Plotino.
5. Posidônio estava, ao que parece, muito interessado no Sol e na Lua. Cleantes já tinha localizado o hegemonikon do universo no Sol (ver pneuma; é geralmente referido também como o «coração do kosmos», baseado numa analogia com a localização da sede da alma; ver kardia) e Posidônio faz dele a fonte de toda a vida física (Diógenes Laércio VII, 144). Ele pode ter sido também o autor da crença nos seus poderes espirituais, e especificamente o autor da opinião de que o nous ou mens vem de e regressa ao Sol, a psyche de e à Lua, e de que o corpo começa e acaba como terra (ver Cícero, Tusc. I, 18-19; Plutarco, De facie 28-30; e confrontar noesis 17, ouranioi 7). Mas mesmo aqui devem também ter estado em jogo considerações puramente religiosas, se bem que o pleno impacto da teologia solar não seja visível senão um pouco mais tarde (ver Corpus Hermeticum XVI e o Hino ao Sol de Julião).
6. Plotino, cuja teoria da emanação é toda baseada numa imagem solar (ver eklampsis, proodos), adota tanto o papel afetivo do Sol (Enéadas IV, 4, 31; confrontar o papel do Sol na teoria da geração aristotélica; ver genesis) como a doutrina da simpatia cósmica. O kosmos é um organismo (zoon) vivo em que todas as partes estão impregnadas da alma universal (psyche tou panthos). As partes atuam entre si não pelo fato de estarem em contato mas por causa da sua semelhança (homoiotes; Enéadas IV, 4, 32).
7. Esta última consideração levanta a Plotino os importantes problemas do contato (haphe) como uma condição necessária da ação e da paixão e a presença de um meio (metaxu) na percepção. Aristóteles respondera à primeira afirmativamente, sustentando que todo o movimento (kinesis) exige necessariamente contato (Physica VII, 242b; VIII, 528a), embora tal não possa, evidentemente, ser sustentado no caso do Primeiro Motor (ver kinoun 9) que é imaterial e move as coisas «como algo amado» (Metafísica 1072b). Há um possível desvio no De gen. et corr. I, 323a onde Aristóteles apela para alguém que é «tocado pela dor», mas o proton kinoun parece, de fato, postular um exemplo inatacável de actio in distans. Sobre o segundo ponto, também Aristóteles sustenta que deve haver um médium entre o objeto percebido e o órgão dos sentidos operante (De anima II, 419a). Plotino, todavia, coerente com os seus pontos de vista sobre a sympatheia, nega a necessidade de um médium de sensação (Enéadas IV, 5).
8. A sympatheia, concebida nestes termos, permite que Plotino solucione alguns problemas relacionados, o da providência (pronoia), o da astrologia, o da adivinhação (mantike) e o da magia. A transcendência de Deus é preservada nesta teoria dado que a sua providência pode ser exercida indiretamente através da inter-relação das coisas (Enéadas IV, 8, 2) e nem a Alma do Mundo nem as almas das estrelas necessitam de contato direto com as coisas que afetam (assim, anteriormente, Fílon, De migre. Abr. 179-181); a deliberação (proairesis) é também excluída (Enéadas IV 4, 31). Os planetas, pelos seus movimentos vários, têm uma variedade de efeitos sobre as coisas; tanto podem produzir (poiesis) como pressagiar (semasia; Enéadas IV, 4, 34-35; confrontar Enéadas II, 3, 7, que admite a adivinhação astrológica dentro do contexto de um ataque geral à astrologia; para a relação dos homens individuais com os planetas individuais, ver ochema, ouranioi 7). Deste modo é estabelecida uma base teorética para a adivinhação (mantike) que consiste exatamente na leitura de tais prognósticos, abordagem há muito corrente nos círculos estoicos (ver Cícero, De div. II, 14, 33). Mas Plotino avança um passo no argumento e sustenta a possibilidade da manipulação e uso de poderes simpatéticos das coisas; estas atividades mágicas não são contudo de natureza sobrenatural; são apenas um outro exemplo de sympatheia e o sábio que, em vez disso, se dedica à contemplação, está bem acima delas (Enéadas IV, 4, 40-44).
Os sucessores de Plotino tomaram uma atitude algo diferente em relação a estes poderes; ver dynamis 6. [Termos Filosóficos Gregos, F. E. Peters]