triás: tríade, estrutura triádica
1. Um dos aspectos mais característicos do platonismo tardio é a presença de uma estrutura triádica nas suas hypostases. O seu emprego é bastante modesto em Plotino cuja grande tríade hipostatica do Hen, do nous e da psyche tou pantos (qq. v.) parece mais baseada em considerações históricas do sincretismo do que em qualquer princípio triádico a priori. Enéadas V, 1, 7, por exemplo, não está muito esquematizado e ti, 9, 1 só ligeiramente o está mais.
2. O mesmo é verdade no que se refere à outra grande tríade de Plotino: o Ser (on), a Vida (zoe) e o Intelecto (nous). Esta tem o seu fundamento na exegese da tradição platônica de um texto célebre no Soph. 248e onde Platão admite no reino do «completamente real» (pantelos on) a mudança (kinesis), a vida, a alma e o pensamento (phronesis). Quaisquer que fossem os motivos exatos e a importância da introdução por Platão desta mudança radical na posição (ver kinesis 6), ela teve um efeito inegável nos seus sucessores. É proeminentemente usada por Plotino para refutar o materialismo dos estoicos: o ser não é um corpo morto; é possuído de vida e inteligência (Enéadas IV, 7, 2; V, 4, 2).
3. Mas o seu uso mais frequente deste conjunto está em ligação com a estrutura e a operação do nous transcendente, e aqui há, provavelmente, a influência convergente de outro texto poderoso, desta vez aristotélico onde se descreve a vida de Deus como a energeia do nous (Metafísica 1072b; sobre a negação desta característica ao Uno plotiniano, ver noeton 4). Para Plotino, o ser, a vida e a inteligência são todas características do nous ao nível cósmico; ele tem uma energeia interior que é a vida e que traz consigo o ser e o pensamento (VI, 7, 13). Parece também estar relacionado com outra tríade, que atinge pleno desenvolvimento em Proclo. A vida é um lançamento para fora, um movimento indefinido (aoristos) que se afasta de uma fonte. Recebe a sua definição por regressar a essa fonte; e este regressar é o nous (ver Enéadas II, 4, 5 e confrontar apeiron 3).
4. O panorama é completamente diferente em Proclo. On, zoe, nous são ainda proeminentes, mais proeminentes, de fato, do que em Plotino (ver Elem. theol, props. 101-103), mas aqui são dominados por um princípio triádico com força de lei onto-lógica: cada causa (aition) procede para o seu efeito (aitiaton) por um «meio termo» (meson). Este princípio aritmético é, por seu turno, um modo operacional de um ponto de vista mais lato que vê o mundo espiritual como o mesmo tipo de continuam ininterrupto que estava concorrentemente a ser propagado para o mundo físico (sobre a ausência de interrupções na scala naturae, ver sympatheia 3). Estes princípios encontram formulação explícita em Proclo (op. cit., prop. 28) e provavelmente remontam a Jamblico (ver Proclo, In Timeu II, 313: Salústio xxvm, 31; sobre a continuidade do mundo espiritual em Plotino, ver Enéadas II, 9, 3).
5. As aplicações que Proclo faz do princípio da estrutura triádica são múltiplas. Em adição a ser – vida – intelecto há causa – poder – efeito (para o meio termo disto, ver dynamis), definido – indefinido – mistura (a «tríade de Filebo»; ver peras, apeiron), permanência-processão-retorno (ver proodos, epistrophe), e a tríade particularmente característica do não-participado (amethekton) – participado (metechomenon)-participante (metechon). Esta última tríade codifica e consagra resposta final do platonismo tardio ao dilema hipotético parmenidiano; se Uno, como Múltiplo? o Uno é não-participado, mas produz algo que é passível de ser participado (metechomenon; para as razões desta produção, ver proodos 3), passível porque é participado por uma pluralidade de participantes (metechonta) (Elem. theol., prop. 23). O segundo termo, o meio na progressão, é superior aos seus participantes dado que eles dependem dele para a sua completude (prop. 24). A mesma proposição estabelece o princípio em sumário: o não-participado é unidade-antes de-pluralidade; o participado é unidade-na-pluralidade, i. é, um e não-um, enquanto os participantes são não-um, contudo um na sua origem (ver esquema semelhante na rubrica holon 11). [Termos Filosóficos Gregos, F. E. Peters]
Todo ser é um na sua unidade, dois na polaridade dos contrários; três no ,seu processo, pelo relacionamento, dos opostos. Os pitagóricos diziam que todas as coisas podem ser vistas como 1, na sua unidade; como 2, nos opostos, (a oposição, depois da substância universal, é a segunda categoria dos pitagóricos) e três nas relações que formam entre si os opostos. (A relação é a terceira categoria dos pitagóricos).
Também o aspecto ternário das coisas finitas (ternário inferior) pode ser visto como principio (início), meio e fim (como termo final), pois o finito surge, perdura mais ou menos e perece. Também pitagoricamente o ternário inferior é dado, quanto às coisas sensíveis, por 1) as coisas sensíveis em sua corporeidade individual, 2) como estruturas geométricas; 3) como redutíveis a números matemáticos.
Todas as coisas sensíveis (corpóreas) são corpos que ocupam um determinado lugar e se dão num determinado tempo, e podem ser compreendidos em sua estrutura geométrica e por sua vez, algebricamente, reduzidas a números matemáticos. Esta seria, em suma, a tríade inferior dos seres.
A tríade superior é formada: 1) pelas formas (correspondentes às ideias de Platão) ou arithmós eidetikós, arithmoí que correspondem aos eide de Aristóteles, à species dos escolásticos; 2) as estruturas ontológicos, o arithmós formado de formas, pois as formas das coisas sensíveis, captáveis intelectualmente, no pensamento platônico, são eidola (diminutivo de eidos), formazinhas. As estruturas ontológicas são formadas pelas formas que são hierarquicamente superiores às formazinhas (eidola), os arithmoi archai, os números arquetípicos.
Esses dois ternários de Pitágoras, juntando-se ao ternário superior da divindade, do UM, formam o nove, o novenário supremo, que, tomado como unidade, é o grande 10, a Década Suprema, a Suprema Unidade, o UM (como Todo, Tudo e único). [Mário Ferreira dos Santos]