15. No Teeteto (155d-157d) Platão apresenta uma teoria da sensação que é ostensivamente atribuída a Protágoras ou a algum relativista heraclítico deste tipo. Mas uma vez que ela não é refutada na continuação e é coerente com outros passos dos diálogos, é possível que represente também os próprios pontos de vista de Platão sobre a sensação. Ela articula-se com o aspecto, frequentemente acentuado por Heráclito, de que entre as aistheta a única realidade é a mudança ou, para usar a linguagem de uma geração mais sofisticada, as aistheta não são realmente substâncias mas qualidades (ver pathos; Platão acentua o mesmo aspecto no Timeu 49b-50, e confrontar stoicheion); são poderes (dynameis) com a capacidade de afetarem (poiein) as outras coisas ou serem afetados (paschein) por elas (Teeteto 156a). Pode igualmente ser verdade, como os primeiros pensadores tinham defendido que o kosmos nada mais é do que kinesis (loc. cit.), mas também aqui são possíveis posteriores aperfeiçoamentos. Mesmo neste estádio (ver Teeteto 181c) Platão é capaz de dividir a genérica kinesis em alteração (alloiosis) e locomoção.
16. É dentro deste contexto que a teoria platônica da sensação se desenvolve. A sua formulação mais genérica encontra-se no Phil. 33d-34a e Timeu 64a-d. A dynamis do agente atua sobre o corpo do paciente. Se a parte afetada é uma parte imóvel na qual a terra predomina (osso, cabelo) a afecção não se espalha; podia resultar dor ou prazer mas não a sensação. Mas se é móvel, como um dos órgãos dos sentidos, a afeição espalha-se até alcançar a consciência (phronimon) e resulta a sensação (comparar Timeu 43c, e ver psyche 17).
17. Podia parecer que estes dois passos sugerem que a percepção é uma pura passividade na pessoa que percebe; mas quando Platão se volta para uma discussão da visão ele volta a Empédocles e Demócrito por causa da teoria que faz da imagem (emphasis) uma produção cooperativa do objecto e do sujeito. Ambos são fundamentalmente qualidades num estado de transformação (alloiosis), mas uma vez postos ao alcance um do outro e com a ajuda da luz do sol (Timeu 45b), a dynamis da brancura no objecto e a qualidade da luz no olho iniciam a locomoção e esta «dá origem» à cor, que faz com que o olho veja e com que o objecto se torne uma coisa colorida (Teeteto 156c-e). Estas mudanças qualitativas, quando transmitidas à alma, conduzem à sensação (Timeu 45c-d, 81c-d). Este passo do Teeteto continua (157a) até retratar a moral heraclítica: se o sujeito e o objecto não estão ao alcance um do outro não temos uma ideia verdadeiramente exata do que na verdade é a dynamis no objecto (para as mudanças em Plotino ver sympatheia).
18. Platão parece, contudo, expressar-se de uma maneira ambivalente. A sua teoria, assim descrita, é fortemente dinâmica na ligação que faz dos pathe com os poderes e na sugestão de que a dynamis é uma qualidade real inerente ao objecto percebido (cf. Teofrasto, De sens. 60). Mas também já na sua outra explicação da gênesis pos-cósmica, havia reduzido todos os corpos aos sólidos geométricos e assim, em última análise, a sua explicação dos pathe sensíveis no Timeu 61d ss. tem laivos de uma espécie de atomismo com a sua redução da qualidade à quantidade na ordem da forma (schema), posição (thesis) e movimento (kinesis), neste caso, evidentemente, locomoção.