Peters – O noûs em Platão

5. Em adição ao noûs imanente nas almas humanas (o logistikon; ver psyche 15, 18) cuja operação é conhecer os eide e governar todas as outras partes da alma (ver noesis 8-9), há, em Platão, um noûs cósmico. Esta razão cósmica emerge no Phil. 26e-27c onde é chamada «o fautor» (demiourgoun, poioun), a «causa da mistura» que é o mundo da genesis. Quase os mesmos termos são aplicados ao demiourgos do Timeu onde o kosmos noetos é chamado a obra do noûs (47e). Ora o noûs é uma propriedade essencial dos deuses partilhada apenas por alguns homens (ibid. 51e) e parece mais que provável que este noûs cósmico é divino (ver Phil. 30d, Timeu 30b). Governa tudo (Leis 875c-d), ordenou o universo (ibid. 966e), e a sua revolução, refletida no movimento dos céus, é um paradigma moral para o homem (ibid. 897d-898a; ver noesis 10).

6. Mas qualquer tentativa para localizar este noûs divino, a causa cósmica do universo, dentro do quadro da metafísica geral de Platão é recebida com frustração, e não o é menos em virtude da natureza «mítica» do relato no Timeu. Com frequência somos informados de que o noûs tem de existir numa alma (ver Soph. 249a, Phil. 30c, Timeu 30b), e não há razões para pensar que isto se refere apenas aos intelectos humanos. Se isto é verdade localiza o noûs, cósmico ou não, abaixo dos eide. O estatuto intermediário da alma no sistema platônico é bem frisado (imortal e imaterial como os eide, plural e sujeita aos pathe como os aistheta; ver psyche 14 e, para a tradição posterior, 29), e somos informados muito especificamente de que o noûs tem uma relação dependente dos eide que são a causa da existência do noûs na alma: o noûs é a capacidade da alma perceber os eide (República 508e). Assim se frustram quaisquer tentativas para encontrar um Deus ou deuses transcendentes em Platão (no Fedro Platão diz que os deuses devem a sua divindade à sua proximidade dos eide), ou mesmo de o ou os identificar com o Bem que está «para além do ser» na República 509b. Outra escola de pensamento, todavia, vê o noûs cósmico como o noûs da Alma do Mundo (psyche tou pantos), rejeitando como mito o fato de no Timeu a Alma do Mundo ser criada pelo demiourgos (34c).

7. Deste modo, pois, Platão cumpre o desiderato da queixa de Sócrates contra o noûs de Anaxágoras: primeiro, está declarado em termos já formulados por Diógenes que o kosmos é como é por ser o trabalho de uma causa inteligente, ajustada para ser «tão boa quanto possível» (Timeu 30 a-b), e depois, numa formulação particularmente platônica, que é uma imagem (eikon) do inteligível, um deus visível (ibid. 92c; sobre a teoria geral, ver mimesis). [Termos Filosóficos Gregos, F. E. Peters]