Natureza

Segundo John N. Deck, Plotino usa a palavra physis («natureza») em vários sentidos, que são necessariamente, mas facilmente, distinguidos. Em um sentido geral, a natureza pode significar a «constituição» de uma coisa ou um princípio. Este é o sentido do termo no qual Plotino pode se referir à natureza do corpo (Enéada III.6.6), a natureza da forma (Eneada III, 6, 4), ou até a natureza do Bem (Eneada IV, 8, 13). Ainda, a natureza pode significar hipóstase, como quando Plotino chama o Uno a primeira natureza e o Noûs a segunda natureza.

Mas em Eneada-III-8 e em muitos outros lugares, a natureza significa a parte inferior da Alma-do-Mundo. Esta parte, funcionando em plantas e na terra (para Plotino a terra é viva — Eneada-IV, 4, 27), é proximamente correlativa à alma generativa-vegetativa no homem e no animal.

A Natureza parece preencher o intervalo entre os mundos inteligível e visível, e na natureza a distinção entre estes dois mundos pode parecer enevoada. Por outro lado, a natureza é uma alma (Eneada-III, 8, 4), um logos, um eidos, (forma como inteligível) (Eneada-III, 8, 2). É imóvel (ibid.), distinta da matéria e do corpo (Eneada-V, 8, 3). As plantas e os animais têm a natureza em si, «como tal, disposta próxima ou ao lado» (Eneada-IV, 4, 14). A matéria não entra em sua constituição (Eneada-V, 9, 6; Eneada-III, 8, 2). Por outro lado há a afirmação: «O que vem da alma e está refletida na matéria é natureza, na qual, ou melhor, diante da qual, seres reais cessam. E estes são o os últimos dos inteligíveis: pois destes em diante só há imitações» (Eneada-IV, 4, 13).

A não ser que este «diante da qual» seja tomado em um sentido forte, que não parece o caso na citação acima, Plotino está localizando a natureza na fronteira entre seres reais e imitações (Eneada-V, 1, 7). Como alma, pode se ter a expectativa de ser um ser real, mas é a última irradiação da alma para em direção ao corpo (Eneada-IV, 4, 13). A mais enfraquecida das coisas reais, não é exatamente um ser real. A contemplação que tem e é, contemplação com a de um homem dormindo ou sonhando, é inferior à contemplação apropriada para um ser real. No entanto é um forma inteligível distinta da forma visível, que é um logos procedendo dela1.

A natureza não é exatamente ser real, nem é, sem qualificação, alma. É verdade que Plotino descreve ela como uma alma inferior, como o rebento da alma (Eneada-III, 8, 4) — mas mesmo o corpo, na medida que é ser, é alma. A natureza é «o último da alma» (Eneada-IV, 4, 13). A alma, descendo nas plantas, faz outra hipóstase. Assim ela «parece» descer; ela desce «de certo modo»; há «algo de» alma, um traço de alma (Eneada-V, 2, 1), nas plantas. A natureza é uma imagem especular da alma, a qual a alma dá ao corpo (Eneada-I, 1, 8). A natureza é uma imagem da sabedoria da Alma-do-Mundo, «possuindo a última intelectualidade irradiada (logos)» (Eneada-IV, 4, 13). A continuidade da natureza com a alma é assim o que Plotino considera como a continuidade linear de um inferior com um superior.


  1. Inge afirma bastante categoricamente: «A Natureza é a mais baixa das existências espirituais… Plotino concede realidade ou existência espiritual à natureza».