O acme da existência de Empédocles é situado por volta de 450 a.C. Tanto sua vida como sua doutrina tiveram enorme repercussão. Natural de Agrigento, membro de uma família influente, sabe-se que Empédocles participou ativamente na preservação da democracia em sua cidade natal e que recusou-se a assumir as funções de rei. A lenda de que terminou banido e que morreu como exilado no Peloponeso é possivelmente falsa. Outra lenda, de que se teria suicidado, jogando-se na cratera do Etna, também não tem fundamento histórico. Consta ainda que teria libertado uma cidade da malária, e que por isto os seus habitantes o homenageavam como a um deus; mas parece que êste e outros relatos sobre a sua existência não passam de lendas.
De seus dois poemas, Sobre a Natureza e Purificações, numerosos fragmentos chegaram até nós. Supõe-se que tenha sofrido forte influência dos eleatas e dos pitagóricos. O frag. 17 é o que melhor permite compreender a sua doutrina; nele, refere-se ao processo de geração e corrupção, e apresenta as suas teorias tingidas em perspectivas parmenídicas. Há quatro elementos originais, e estes elementos compõem a formação de todos os entes: fogo, terra, água e ar (sobre os elementos: frags. 6, 8, 9, 11, 12, IS, 14, 17, 26, 62, 96, 98). Estes elementos e todo o processo do real são determinados pelas forças do Amor e do Ódio, que regem, ciclicamente, o cosmos (sobre o Amor e o Ódio: frags. 16, 17, 20, 21, 22, 30, 35, 59). Coerente com estas opiniões e de grande repercussão é também a explicação que dá Empédocles ao conhecimento e ao processo do pensamento (conforme os frags. 2, 3, 84, 105, 106, 107, 108, 109).
Várias ações extraordinárias eram atribuídas à sabedoria e poder de Empédocles. Reconhecera que uma epidemia de peste, que assolava a cidade de Selinonte, provinha das emanações insalubres de água próximas da cidade. Empédocles pagou do seu bolso os trabalhos necessários para desviar o curso de rios próximos, que, com as suas correntes, purificaram os locais e arrastaram os miasmas pestilenciais. Transbordando de reconhecimento, os habitantes de Selinonte honraram-no como a um deus. Passava igualmente por ter modificado o clima de Agrigento, fazendo estender peles de asno numa estreita passagem por onde se precipitavam os ventos etésios, cuja violência era uma perpétua ameaça para as colheitas.
Mas as proezas mais extraordinárias de Empédocles exerceram-se no domínio da medicina. Conta-se que ressuscitara uma mulher que já não respirava havia trinta dias. Estava mergulhada em profunda letargia, mas Empédocles descobriu um ponto de calor à flor da pele e conseguiu trazer à vida a que devia ser uma histérica.
Conta-se, também, que, pela omnipotência da música, era capaz de apaziguar as paixões. Foi o que fez quando, vendo surgir em casa do seu hospedeiro um jovem furioso que lhe lançava em rosto ter condenado seu pai à morte, conseguiu restituir a calma ao que a tinha perdido, cantando os versos da Odisseia onde se fala do nepentés, a droga que acalma a dor, a cólera e cura todos os males.
Empédocles participou de muito perto na vida política da sua cidade. Seu pai tinha contribuído para a proclamação de uma constituição democrática. Após a sua morte, o partido aristocrático levantou a cabeça e Empédocles tomou então partido pelo povo e defendeu a democracia. Foi-lhe proposto o título de rei, mas recusou. Várias anedotas mostram-no a fulminar os que tentavam obter qualquer privilégio social. Uma tradição afirma mesmo que fez dissolver a Assembleia dos Mil, constituída por cidadãos escolhidos entre as famílias mais ricas, segundo um sistema censitário dos mais restritos. Empédocles concedeu um dote a numerosas jovens da sua cidade e adquiriu por todas as suas liberalidades enorme popularidade, o que, naturalmente, lhe atraiu invejas e inimizades.
Empédocles deixou a cidade natal para viajar. Foi a Turioi e visitou em seguida a Grécia. Diz-se que em Olímpia mandou cantar as suas Purificações pelo rapsodo Cleomenes. É possível que tivesse ido a Atenas, mas o fato não está absolutamente comprovado. Cerca de 440, decidiu regressar a Agrigento, mas a ausência de dez anos tinha permitido aos seus inimigos adquirir influência. Foi proibido de entrar na cidade. Exilado, acompanhado do discípulo Pausânias, compôs a sua obra sobre a natureza, durante os últimos anos de vida.
Como teve lugar a morte de um ser cuja existência havia sido tão extraordinária? Não se sabe ao certo. Mas a lenda veio substituir a história, de tal modo que faz, doravante, parte integrante de toda a atmosfera que envolve Empédocles. Uns pretendem que Empédocles se afogou, outros que morreu em consequência de uma ferida que fizera ao cair do seu carro. Mas a lenda mais grandiosa é a da sua desaparição no Etna. Deixando de lado as numerosas variantes de detalhe, parece que nos encontramos em presença dos seguintes elementos. Empédocles oferecia um sacrifício e os amigos foram convidados para o festim. Quando este terminou, foram descansar para debaixo das árvores vizinhas, mas Empédocles ficou no lugar que ocupara durante o banquete. De madrugada, quando os convidados se levantaram, Empédocles havia desaparecido. Um criado contou que, durante a noite, tinha ouvido uma voz forte chamando Empédocles, enquanto uma luz aparecia no céu. Pausânias declarou aios convidados que qualquer busca seria inútil, porque Empédocles, tornado deus, devia ter sido arrebatado à Terra para ser conduzido aos céus. Sobre esta lenda enxertou-se uma outra que fascinou os românticos. Empédocles ter-se-ia precipitado na cratera do Etna, a fim de se purificar no fogo, mergulhar no seio da Terra e voltar ao ciclo dos seres, princípio da metempsicose. O Etna teria seguidamente repelido uma das sandálias de bronze do filósofo.
Entre o mistério e a lenda, acabou a vida deste filósofo-taumaturgo, cuja morte fabulosa devia sugestionar tão vivamente a imaginação de Hölderlin e Nietzsche.
Conhecemos os títulos de duas obras de Empédocles, títulos que são devidos, talvez, aos escoliastas posteriores ao filósofo: Da Natureza e Purificações. Destes dois livros escritos em verso, restam-nos apenas fragmentos. (Jean Brun, "Pré-Socráticos")
- Parmênides teria sido o primeiro pluralista, se o seu dualismo fosse o da realidade, e não o da aparência — da aparência, pura e simples, ou da aparência da realidade: o dualismo da Luz e da Noite é questão de nomos («convenção»), e não de physis («natureza»), Empédocles institui o pluralismo na realidade, na medida em que cada um dos seus quatro elementos se determina como idêntico a si mesmo e não idêntico a qualquer dos outros: é a definição parmenídea dos contrários, cada um deles, com uma determinação do Ser — a identidade (frg. 3, 54-59). Quer dizer, a unicidade do Ser é substituída pela pluralidade dos elementos, mas a unidade mantém-se, quanto à estrutura dos mesmos elementos. É clara e está perfeitamente esclarecida a intenção de Empédocles: desincompatibilizar a imobilidade (invariância) do Ser com a mobilidade (variância) da aparência; para além de Parmênides, o filósofo de Agrigento procura, no monismo «físico» dos filósofos de Mileto, o trânsito do princípio para o principado. O Esfero tem algo do Ser de Parmênides e do Ápeiron de Anaximandro: é perfeitamente indiferenciado: (pámpan ápeiron, frg. 28, 1). Mas aqui cessam todas as analogias. No Esfero, indiferenciada a mistura dos quatro elementos, tem início um processo de diferenciação, que resulta na diferenciada estrutura do mundo, tal como ele se nos apresenta. A força do Ódio, da mistura separando os elementos, cada um para seu lado, forma as quatro massas cósmicas (cosmogonia), enquanto a força do Amor, de novo mistura os elementos, para formar os seres vivos que habitam o mundo (zoogonia). Deixamos em aberto a questão de saber se o processo é cíclico e, portanto, se o fim se reúne ao princípio, restabelecendo-se o Esfero-Indiferenciado. O que mais importa acentuar é que Empédocles propõe uma Indiferença primordial, embora esta, agora (e só agora) seja a da mistura dos elementos, e sujeita a uma variância que não cabia nem no Ápeiron de Anaximandro, nem ao Ser de Parmênides. E se perguntássemos com que fim ele atribuiu a cada elemento uma das determinações do Ser — a identidade inalterável através de todo o processo cosmogônico e zoogônico — a resposta, mais uma vez, acena para o mesmo ponto de onde arranca o pensamento existencial de Parmênides: «Loucos! Longe não vão seus pensamentos, desses que creem possa nascer algo que antes não era, ou que alguma coisa de todo possa destruir-se ou morrer!» (Emp., frg. 11.) A cifra cosmogônica e a cifra escatológica continuam emparelhadas, mesmo no poema «físico». Que se trata ainda de uma codificação do mistério do horizonte, é o que se verifica no poema «catártico». (Eudoro de Sousa, "Horizonte e Complementaridade")
Empédocles de Agrigento, na Magna Grécia, autor de dois poemas, Da natureza e As purificações, é uma figura imensamente interessante. A personalidade de Empédocles foi filosófica, religiosa, biológica. O ponto central de seu pensamento é a teoria dos quatro elementos ou raízes de todas as coisas, terra, água, ar e fogo, movidos por dois princípios; o amor e o ódio. Suas ideias acerca do homem como realidade biológica e sobre a vida a a transmigração das almas significam um ponto de vista mais maduro na filosofia pré-socrática, embora se ligue às especulações religiosas e pitagóricas.
"Um homem sábio não opinaria em seu coração que os mortais só existem e há para eles bens e males enquanto vivem o que chamam a vida, e que antes de se formarem e depois de se dissolverem não são nada." (Fr. 15 de Diels.)
"Fui em outro tempo um jovem e uma jovem, um arbusto e uma ave, e um peixe mudo no mar." (Fr. 117 de Diels.)
"A terra que envolve o homem. . ." (Fr. 148 de Diels.)
"(A natureza), que reveste as almas de uma estranha envoltura de carne." (Fr. 126 de Diels.)
Empédocles não reduz a existência do homem ao tempo de sua vida; supõe para ele uma preexistência e uma perduração após a morte; porém parece excessivo interpretar estas palavras, pelo menos em sentido rigoroso, como uma doutrina próxima àquela que Platão expõe no Fedro, ou à de uma vida perdurável, transcendente. O segundo dos fragmentos citados assinala o alcance do primeiro, reduzido ao de uma pervivência da alma em distintos estados, em diversas "vidas"; trata-se, porém, de uma identidade da alma através de suas sucessivas encarnações, como o prova a insistência de Empédocles ao usar o pronome pessoal eu (Ego), e o dualismo que indica energicamente entre as envolturas de terra ou carne e a alma humana que as recebe.
Sobre Empédocles, entre outros estudos, pode-se ver Ettore Bignone: Empedocle, Studio critico. Traduzione e commentario delle testemonianze e dei frammentiEttore Bignone: Empedocle, Studio critico. Traduzione e commentario delle testemonianze e dei frammenti. (Turin, 1916)